Processos de Gestão Democrática

por Alexsandro M. Medeiros

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postado em fev. 2021

            Até pouco tempo atrás, para ser mais exato antes do Governo do Presidente Jair Bolsonaro, o Brasil tinha experimentado um processo crescente no modelo de gestão participativa baseado em um processo de institucionalização dos mecanismos de participação, permitindo o desenvolvimento de uma série de políticas públicas nos mais diversos segmentos sociais.

            Vários estudiosos e pesquisadores da área de políticas públicas chamam a atenção para o fato de como tais políticas devem ser construídas hoje com participação social, o que podemos chamar de Processos de Gestão Democrática, o que de alguma forma está diretamente relacionado com os processo de formulação, implementação e avaliação. Como é o caso de Souza (2013, p. 16) ao ressaltar que os “processos de avaliação pressupõem a interação com os seus beneficiários, enriquecendo o debate social, fomentando a politização da sociedade pela via da participação efetiva, inclusive nos processos de tomadas de decisões”.

            Dentre os inúmeros pesquisadores e pesquisadoras que tratam do tema, a ênfase nas instituições participativas já foi destacada por Avritzer (2007); Lüchmann (2002); Borba e Lüchmann (2007).

            No texto sobre o Ciclo de Políticas Públicas vimos que o processo de formulação de políticas públicas pode ser elaborado de forma participativa e democrática, ou de forma autoritária e que o processo de implementação pode ser executado segundo o modelo top down (de cima para baixo) ou o modelo bottom up (de baixo para cima).

            Para Ferreira (2011, p. 51) o planejamento das políticas públicas “não pode ser visto como um processo ‘de cima para baixo’ (top-down), ou seja, em que as decisões são tomadas por autoridades que têm certo controle do processo e que decidem o que e como serão formuladas e implementadas as políticas”.

            No modelo de gestão democrática deve ser levado em consideração no fluxo do processo de planejamento a população afetada por uma determinada política, ou seja, aqueles que estão mais próximos das ações resultadas das políticas, o que pressupõe que seja um processo bottom up (de baixo para cima). A participação da população deve contribuir na implementação das políticas públicas em um processo de gestão democrática e social e “deve ser permeada por uma ação política deliberativa, na qual o indivíduo participa decidindo seu destino como pessoa, eleitor, trabalhador ou consumidor” (FERREIRA, 2011, p. 53).

            Em um modelo de gestão democrática a sociedade civil organizada deve ser estimulada a participar do monitoramento e implementação de políticas públicas, e podemos tomar como exemplo, o monitoramento e implementação da política orçamentária com base no planejamento do governo que inclui o PPA (Plano Plurianual), LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e LOA (Lei Orçamentária Anual). É o que podemos chamar de uma política de participação e controle social do processo orçamentário que deve ocorrer nas três esferas de governo: municipal, estadual e federal.

O PPA é essencial ao planejamento das políticas públicas pois, define, em linhas gerais, as concepções, os programas, os objetivos e as metas para os próximos quatro anos. A LDO define os programas prioritários, as metas físicas e as linhas gerais de como deverá ser elaborado o orçamento do próximo ano. A LOA é como e onde os recursos públicos serão aplicados, isto é, o orçamento público (MORONI, 2009, p. 129).

            Além disso, a imagem acima destaca a importância para o planejamento de políticas públicas no âmbito municipal o Plano Diretor, que deve servir de base para a execução dos programas de governo devendo ser revisto periodicamente, pois, como afirma Norma Lacerda et. al.:

O Plano Diretor visa orientar as ações dos agentes públicos e privados no processo de desenvolvimento municipal, podendo se tornar um importante instrumento de planejamento se for capaz de aglutinar diversos atores sociais. O seu maior desafio é a combinação das dimensões técnica e política: dimensão técnica, à medida que tem de ser respaldado em análises fundamentadas em um conjunto informacional; dimensão política, uma vez que a sua elaboração constitui um espaço privilegiado de negociação entre os atores sociais, confrontando e articulando seus interesses (LACERDA et al., 2005, p. 56).

            Esse modelo de Gestão Democrática com participação popular foi implementado durante o governo do ex presidente Lula, considerando o PPA 2004-2007, embora sem muito êxito pois, como afirma José Moroni (2009), um dos grandes problemas foi a falta de continuidade do processo e que só em março de 2007 foi instituído pelo MPOG (Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão) um Grupo de Trabalho (GT) com a finalidade de elaborar propostas de participação social para o acompanhamento do PPA, LDO e LOA. Além disso, o governo não considerou as contribuições da sociedade civil, o que levou as organizações representantes da sociedade civil a construírem em junho de 2009 uma saída em conjunto do GT. “Para o PPA de 2008/2011 o Governo optou em não fazer nenhum processo participativo” (MORONI, 2009, p. 132).

            Em nível federal, considerando o PPA 2004-2007, eis as ações que puderam ser desenvolvidas (MORONI, 2009, p. 131).

  1. Formação de GT entre governo e sociedade civil para monitoramento do PPA;
  2. Construção, com a sociedade civil, dos mecanismos e da metodologia de participação nos processos orçamentários;
  3. Acesso às informações sobre a execução física e financeira do PPA através do Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira) e Sigplan (Sistema de Informações Gerais e de Planejamento);
  4. Elaboração de indicadores para o acompanhamento do impacto das políticas públicas por parte da sociedade civil.

 

Conselhos Gestores de Políticas Públicas

            Além do monitoramento e implementação da política orçamentária tomando como base as leis orçamentárias – LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e LOA (Lei Orçamentária Anual) – e o PPA (Plano Plurianual), podemos enfatizar o papel dos Conselhos Gestores de Políticas Públicas neste processo.

            Os estudos sobre conselhos gestores apontam, por um lado, para um aumento da participação da sociedade no processo de elaboração de políticas públicas ao mesmo tempo em que mostram “que este desenho tem esbarrado em limites que muitas vezes esvaziam ou restringem seus potenciais democratizantes” (WÖHLKE, 2016, p. 83).

            Aliado aos Conselhos Gestores de Políticas Públicas, temos as Conferências de Políticas Públicas, que são geralmente convocadas pelo poder executivo e organizadas pelos Conselhos, como um espaço de participação e elaboração de políticas públicas como mostra Wöhlke (2016, p. 83) no quadro abaixo:

            “As conferências são espaços participativos convocados pelo poder executivo com certa periodicidade para a interlocução entre representantes do Estado e da sociedade civil visando a formulação de propostas para determinada política pública” (WÖHLKE, 2016, p. 87). No quadro acima vemos a dinâmica de como a elaboração de políticas públicas se inicia nos Conselhos, a partir de uma estrutura piramidal que se inicia nos Municípios e segue nas esferas estadual e federal e aquilo que foi objeto de deliberação nas Conferências é encaminhado ao poder executivo que se encarrega de implementar uma determinada política sendo que o poder executivo tem autonomia e atribuição legal para decidir se deve ou não implementar aquilo que foi deliberado nas Conferências. “O grande desafio é saber de que forma estas instituições participativas colaboram para o aprimoramento da gestão e da política pública, além de saber que posição estes espaços assumem na análise da política pública” (WÖHLKE, 2016, p. 88-89).

 

Referências Bibliográficas

AVRITZER, Leonardo. Sociedade Civil, Instituições Participativas e Representação: da autorização à legitimidade da ação. Dados – Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 50, n.3, p. 443-464, 2007. Acesso em 08 fev. 2021.

BORBA, Julian; LUCHAMM, Lígia Helena. Orçamento Participativo: análise das experiências desenvolvidas em Santa Catarina. Florianópolis: Insular, 2007.

FERREIRA, Patrícia Aparecida. Gestão de Políticas Públicas: uma proposta de modelo processual de análise. Tese (Doutorado em Administração), Programa de Pós-Graduação em Administração, Universidade Federal de Lavras, Lavras-MG, 2011.

LACERDA, Norma [et al.]. Planos Diretores Municipais: aspectos legais e conceituais. R. B. de Estudos Urbanos e Regionais, v. 7, n. 1, maio/2005, pp. 55-72. Acesso em: 23 fev. 2021

LUCHMANN, Ligia Helena Hahn. Possibilidades e limites da democracia deliberativa: a experiência do orçamento participativo de Porto Alegre. 2002. Tese (Doutorado), Ciências Sociais, Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP, 2002.

MORONI, José Antônio. O direito à participação no governo Lula. In: AVRITZER, Leonardo [org.]. Experiências nacionais de participação social. São Paulo: Cortez, 2009. (Coleção Democracia Participativa).

SOUZA, Lanara Guimarães de. Avaliação pública de políticas educacionais: concepções e práticas avaliativas dos organismos internacionais no Brasil. Tese (Doutorado em Educação), Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2013.

WÖHLKE, Roberto. Análise de políticas públicas: o papel das instituições participativas na efetividade da Política Municipal de Assistência Social de Florianópolis no período de 2011 a 2015. Dissertação (Mestrado em Sociologia Política), Programa de Pós-graduação em Sociologia Política, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis-SC, 2016.

 

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